A Federação das Indústrias do Estado de Mato Grosso (Fiemt) promoveu um debate online na sexta-feira (03/04) analisando a crise e o cenário provável pós-crise econômica decorrente do efeito coronavírus no mercado.
A discussão foi conduzida pelo presidente do Sistema Fiemt, Gustavo de Oliveira, junto com o economista e jornalista Luís Artur Nogueira. Em duas horas de conversa, Nogueira fez um amplo panorama das perspectivas para o Brasil e o mundo na economia para o ano de 2020 e 2021.
Várias projeções foram feitas para o país para os próximos dois anos, sendo que a mais otimista prevê que, passada a crise, em 2021 o Brasil poderá chegar a um crescimento de 5,5% ao ano. A mais pessimista ainda é positiva, com um crescimento de 1,5% para o ano que vem. “Isto se o país e o mundo não sofrerem uma nova onda pandêmica do vírus”, destaca o economista.
Luis Nogueira fez um alerta para o governo e os empresários: “A crise vai passar e poderemos retomar o crescimento, mas para que isto aconteça não podemos deixar que empresas e empregos desapareçam. Temos que preservar esses dois fatores”.
O MT Econômico acompanhou todo o debate e trás os principais pontos abordados:
Cenário Mundial
Nogueira apontou três cenários para o mundo este ano:
– Uma estagnação econômica em 2020 é certeza;
– Uma recessão econômica em 2020 é muito provável;
– Uma depressão econômica em 2020 é possível;
O que vai acontecer depende de dois fatores: se o mundo não tiver uma nova onda de pandemia do coronavírus até o final de 2020; e como se dará a recuperação dos Estados Unidos e da China, respectivamente a primeira e a segunda maiores economias do mundo. As projeções, sem uma nova onda epidêmica, são de que o mundo tenha o chamado “crescimento negativo” entre 0,5 a 1%” em 2020. Já para 2021, a economia mundial volta a crescer, com projeções que chegam a 2% e 2,5% no ano.
Mas, se tanto a China quanto o mundo sofrerem um novo surto do coronavírus passada esta primeira onda, então todos os países poderão entrar em um caos econômico e social, com uma forte depressão financeira nos próximos anos.
Brasil
O primeiro semestre de 2020 será muito ruim para o Brasil. O país não tem a mesma capacidade de injetar recursos na economia como países ricos, entre eles Estados Unidos e Alemanha, nações que tinham suas contas públicas em dia antes da crise. A Alemanha, por exemplo, pode gastar até 20% do PIB para salvar empresas e empregos e pode segurar uma quarentena por até 90 dias. O que não acontece com o Brasil, que já vinha com um déficit público alto.
“Neste momento, todos, especialmente nossos governantes e políticos, estão percebendo o quanto é importante manter as contas públicas equilibradas. Países que estavam nesta situação tem muito mais condições de socorrer o setor privado e sair da crise de forma mais rápida e melhor”.
Para o Brasil, bancos e analistas têm projeções diferentes em relação ao número da queda na econômica em 2020. Luis acredita que o PIB ficará negativo em 2%. Quase o mesmo número foi projetado pela XP Investimentos que calcula um PIB negativo de 1,9%. Para o Bradesco o PIB negativo será de apenas 1%. Já a revista americana The Economist é extremamente pessimista, projetando o produto interno bruto brasileiro de -5,5% em 2020.
Mas, o Brasil conseguindo sair da crise atual, mesmo com todo gasto do governo para salvar empresas e empregos, e voltando a rigidez nos gastos públicos e promovendo as reformas estruturantes, especialmente as reformas administrativa e tributária, as projeções para 2021 são bem otimistas, com crescimento do PIB. As projeções são: Luís Artur 2,5%; XP Investimentos 2,6%; Banco Bradesco 3%. Já o Banco Itaú é o mais otimista, projetando um crescimento do PIB brasileiro em 2021 de 5,5%.
As projeções em números, segundo o cenário apresentado por Luís Artur Nogueira para 2020 são:
PIB: -4% a 0%
Inflação (IPCA): 3%
Juros Básicos (Selic): 3% a 3,75% ao ano
Dólar: R$ 4,50 a R$ 5,0%
Produção Industrial: -5% a -1%
Varejo: 0% a 1,0%
Crédito total: +5% a 10%
Investimento Estrangeiro Direto: US$ 80 bilhões
Balança Comercial: +US$ 35 bilhões
Desemprego: 13% a 15% (o Brasil vai saltar dos atuais 12 milhões de desempregados para até R$ 15 milhões).
Semana decisiva
O presidente do Sistema Fiemt Gustavo de Oliveira destacou que as empresas brasileiras já vinham em um processo de descapitalização nos últimos anos, devido à crise econômica iniciada em 2014, e o momento atual pegou a maioria das empresas sem caixa reserva. Essa descapitalização também fez com que os empresários não investissem em inovação e tecnologia, o que piora a recuperação.
Luis Nogueira apontou que a semana que se inicia na próxima segunda-feira, 06 de abril, será decisiva para muitas empresas e empregados, pois o quinto dia útil do mês implica no pagamento de muitos compromissos, especialmente na folha salarial, e boa parte dos empresários já não tem caixa para estas despesas. “O pacote de recursos anunciados pelo Governo Federal só estará disponível para o mês de maio, o que é um grande erro do Governo, deveria ser já para este mês. Só terão como pagar quem já tinha um bom caixa. Teremos milhares de empresas quebrando na próxima semana”.
Como o pico da pandemia do coronavírus no Brasil começa também na próxima semana, ocorrendo no período de 10 de abril a 10 de maio, não é possível para o país sair da quarentena e retomar as atividades econômicas imediatamente. Por isso, é essencial que o Governo Federal acelere o atendimento à população mais carente, sob o perigo de que o país enfrente um caos social, com as pessoas saindo da quarentena em busca de formas de simplesmente ter acesso a alimentação e recursos financeiros. Para Luís, a reabertura de empresas e do comércio deve acontecer somente em maio, com as aulas em escolas e universidades retornando somente em junho.
Agronegócio
Com exceção do algodão e o etanol, o agronegócio brasileiro ainda não foi afetado pela crise como o varejo, podendo ter um crescimento de 1% ainda em 2020. Luís Nogueira diz que sua projeção de um PIB negativo em 2% só não é maior justamente porque o crescimento do agronegócio chegará a 1% neste ano. Os produtores rurais poderão ter problemas com a próxima safra, já que correm o risco de precisar comprar os insumos (fertilizantes e defensivos) com dólar em alta no segundo semestre e venderem a produção com o dólar em baixa no primeiro semestre de 2021. “Uma das coisas que falo há anos e que o Governo Federal já deveria ter implantado é um hedge específico para o agronegócio, para proteger o setor de situações como a que pode vir pela frente”.
Para o economista, o governo brasileiro tem obrigação de ajudar o setor do biocombustível, em especial o etanol, que no momento sofre um grande impacto devido, não só a crise do coronavírus que reduziu o consumo a menos de 50%, mas também pela disputa entre a Rússia e a Arábia Saudita que derrubou o preço do petróleo. “O país tem uma dívida com o setor do etanol. Foi o setor quem segurou o consumo de combustível no Brasil quando o petróleo estava a 100 dólares o barril. Agora, como petróleo a 20 dólares, é obrigação do país segurar o setor do etanol. O Governo Federal tem que olhar para cada setor com suas particularidades”. O preço baixo do petróleo também reflete na demanda pelo algodão, já que o uso poliéster pela indústria têxtil se torna muito mais vantajoso.
Salvar empresas e empregos
Por fim, Luís Nogueira aponta o cenário pós-crise, com inúmeras oportunidades. Entre as perspectivas estão: uma demanda reprimida em vários setores; haverá menos peças importadas e mais exportação; juros baixos para impulsionar o crédito; ganhos de produtividade x mercado de trabalho”.
“O mundo não acabou, apenas fechou temporariamente para balanço. Quando tudo voltar ao normal, nós vamos precisar novamente das empresas, por isso é essencial que elas se mantenham. O Governo e os empresários tem que focar nisso. A velocidade de nossa recuperação dependerá da nossa capacidade de salvar empresas e trabalhadores neste momento”.
Dicas:
– Cuide com carinho dos funcionários, fornecedores, amigos e parentes;
– Antecipe negociações, feche contratos e ajude a movimentar a economia neste momento;
– Amplie seu círculo de conversas e troca de informações; saia da sua área de conforto;
– Procure informações em fontes confiáveis e aproveite os benefícios fiscais;
– Não pense no pacote do Governo como uma boia de salvação, especialmente para empresas que já vinham mal. O momento mostra o quanto é importante uma empresa estar equilibrada;
Currículo dos participantes da Live
Luís Artur Nogueira tem MBA em mercado financeiro. Atualmente é colunista de economia da revista e do site Isto é Dinheiro, e do Portal iG. Com mais de 20 anos de profissão, já passou pelas revistas Exame e INFO, e pelas rádios Trianon e Bandeirantes. Em 2009, recebeu o título de "Jornalista Econômico do Ano", oferecido pela Ordem dos Economistas do Brasil, pela cobertura feita na crise internacional, além de receber, em 2015, a medalha "Ministro Celso Furtado", em São Paulo. Por quatro anos consecutivos ele figurou entre os 10 maiores jornalistas econômicos ranqueados pelo Prêmio Comunique-se, considerado o Oscar do Jornalismo.
Gustavo de Oliveira é graduado em Engenharia Civil, pós-graduado em Gestão Empresarial e em Fusões e Aquisições de Empresas, além de ter especialização em Geotecnia. É empresário do ramo da mineração e de transportes, já atuou como secretário de Estado por três anos, e atualmente, é o presidente do Sistema Fiemt – a principal entidade de representação das indústrias de Mato Grosso, além de desempenhar os cargos de presidente do Conselho Regional do Sesi e Senai no estado, de diretor na Confederação Nacional da Indústria (CNI) e é conselheiro titular da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI).
O encontro online também teve a participação especial do presidente do Sindalcool-MT (setor sucroalcooleiro) e vice-presidente da Fiemt, Sílvio Rangel, do presidente do Cipem (setor de base florestal), João Baldasso e do empresário do ramo de alimentação de Rondonópolis, Ailton Ferreira, também um dos vice-presidentes da Fiemt.
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